sábado, 24 de dezembro de 2016

BANALIDADES - Requiem para uma aranha



Ela já estava quando eu cheguei. Como tinha a teia no canto da janela da cozinha junto ao tecto, e nessa zona só está a máquina de lavar roupa, decidi deixá-la ficar. Embora pensando que provavelmente a aranha não iria ter muito com que se alimentar porque eu ponho mosquiteiros nas janelas, para evitar moscas e mosquitos e outros insectos voadores. Mas como não ponho os mosquiteitos completamente herméticos, só colo a rede em cima e em baixo, sempre há um insecto ou outro, geralmente mosquitos pequeninos e borboletas nocturnas também pequenas, que lá vão entrando uma vez por outra. Vi-a uma vez a devorar uma dessas borboletas que tinha capturado na sua teia. E vi-a outra vez a comer outra borboleta, que tinha sucumbido a uma esguichadela de extermina insectos que eu lhe tinha dado, e que ela tinha ido buscar, já cadáver, ao parapeito da bandeira da janela próximo da teia, para onde a borboleta tinha ido morrer e que de onde eu ainda não a tinha tirado. Nessa altura pensei que a aranha estava cheia de fome e também que ia morrer por comer a borboleta envenenada. Mas ela não a comeu. Algum tempo depois largou a borboleta na teia e começou uma actividade frenética para trás e para a frente, entre o centro da teia, onde estava a borboleta, e a bandeira da janela. Suponho que estava a reforçar os fios da teia que iam até à janela. Depois foi buscar a borboleta e largou-a no mesmo sítio onde tinha ido buscá-la. Mas ontem... a aranha morreu. Não sei se chegou ao fim da vida normal dela ou se morreu de inanição. Sei é que, desde a manhã de ontem, está toda encarquilhada num pedacinho da teia junto ao vidro da bandeira da janela. E que amanhã vou ter de usar o escadote para a retirar e retirar a teia.